O casamento e a arte de se relacionar
Este artigo aborda os fundamentos dos relacionamentos e as dificuldades que ocorrem em um casamento.
O casamento em nossa sociedade é um símbolo de união amorosa entre duas pessoas, está envolto por um conjunto de intenções, emoções, desejos e fantasias. Pressupõe uma relação de intimidade. As pessoas se casam por inúmeras razões, normalmente porque reconhecem entre si uma sintonia e querem construir um futuro em conjunto. O casamento envolve escolha e decisão.
O casamento envolve escolha e decisão. Escolhe-se um parceiro entre tantos outros. Esta escolha é individual, mas a decisão pela união é conjunta. Alguém pode amar outra pessoa sozinha, mas não pode decidir se casar sem que ambos concordem.
Então se duas pessoas se amam, escolhem-se e decidem se casar, por que há tanto desentendimento nas relações? Ovídio, um poeta romano, em seu livro A Arte de Amar, diz: “o amor me há de ceder, por muito que me fira com seu arco”. Cedemos ao amor, por mais que saibamos que por ele seremos feridos. Então, temos que aprender a nos relacionar e nos comunicar, esta arte deve ser exercitada a cada instante e é de fundamental importância às pessoas e aos casais.
Neste processo, os ruídos e desentendimentos ocorrem pelos modelos mentais que cada um tem sobre como outro é e como se dará o relacionamento. Estes modelos mentais vêm da nossa história, do que vivemos com nossos pais, do que vemos na sociedade, do que desejamos, do que o outro representa para mim e do que eu represento para ele. Assim, vemos que os relacionamentos ocorrem em algumas etapas.
Na primeira etapa, nos relacionamos com o outro, mas não o vemos como ele é, enxergamos as aparências. E projetamos nesta aparência aquilo que queríamos que o outro fosse. Mas, para que haja um relacionamento, é preciso a segunda etapa, a qual se caracteriza pela necessidade de criar laços entre as duas pessoas. E para criar laços, as pessoas envolvidas num relacionamento precisam estabelecer diálogos.
Já pararam para pensar o que significa diálogo? É a conversa que ocorre entre duas pessoas. Nele, a palavra é interindividual, vem de um participante da comunicação e vai para o outro, num processo vivo, em que as pessoas envolvidas participam em iguais condições. Diferente do monólogo, no qual só um fala sem considerar o outro, dialogar significa entrar no mundo do outro para tentar apreender sua perspectiva a respeito da vida, do mundo e de si mesmo.
Nesta etapa do relacionamento, há o encontro com o outro, conhecem-se na intimidade. Com isto, as pessoas podem perceber o quanto são diferentes. Quando casam, pensam que são semelhantes e que se escolheram por causa das semelhanças. O complicado é que os seres humanos são semelhantes e diferentes ao mesmo tempo. Somos da espécie humana, por isso, semelhantes, o que permite a ciência formular teorias. Mas a forma como vivemos as experiências humanas é única, particular de cada sujeito, e isto nos faz diferentes. As pessoas têm ritmos diferentes, estão em tempos diferentes e ocupam espaços diferentes.
É através do diálogo que se aprende a reconhecer o outro e a si próprio para com isto respeitar e sintonizar o jeito de ser de cada um. Esta é a terceira etapa, a de sintonizar as diferenças. E esta costuma ser a mais difícil, porque exige paciência, e, muitas vezes, um casamento acaba por não haver condições de harmonizar estas diferenças.
Mas se o relacionamento é difícil, por que as pessoas continuam querendo casar? Interessante reflexão, não acham? É que a interação com o outro é parte inevitável do desenvolvimento das pessoas. Temos necessidade uns dos outros – não porque somos iguais, mas porque somos únicos.
Estas três etapas ocorrem a todo instante no casamento. Podem ser mais intensas no início, até que se construa uma relação, quando o casal consegue manter constante o nível de diálogo, quando cada um preserva sua individualidade e está aberto a sintonizar as diferenças. Pois as pessoas conseguem ser semelhantes, diferentes e únicas ao mesmo tempo.
Ana Paula Escorsin – Psicóloga.